Sinopse

Era uma amizade. Uma promessa. Eles ficariam juntos pra sempre, não importava o tempo que passasse. Ele foi embora, ela esperou. Mas os tempos mudam, as pessoas mudam. E as promessas? Ele resolveu voltar. Ela não é mais a mesma. E os dois, será que esse ainda existe?

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Sete Anos


Depois daquela aula eu o evitei o máximo possível. Fiquei um tempo grande conversando com Lola durante o intervalo, pra ver se eu conseguia tirar aqueles pensamentos da cabeça e toda raiva do meu corpo, mas não foi tão fácil assim. Por isso mesmo, fingi enjoos e fui à enfermaria, esperando que me deixassem ir pra casa mais cedo. Ao chegar, senhora Hipckens, a enfermeira idosa, baixinha e gordinha que tinha sempre um sorriso amável no rosto, verificou minha temperatura e minha pressão e, como era de se esperar, eu não estava mesmo bem. Ela me fez a liberação e eu fui até a coordenação, para sair. No caminho, no intervalo entre uma aula e outra pude ver Josh me encarar do outro lado do corredor e pensei que ele viesse falar comigo. Já estava prepara para correr quando vi que o pessoal mais legal da escola, os mais populares, se aproximavam e puxavam assunto com ele, e, como sempre, ele estava sendo o mais cordial possível. Aproveitei a deixa e entrei correndo na sala de ar condicionado a minha direita, indo direto ao balcão para entregar o papel à moça de óculos. Ela leu com atenção e me liberou alguns momentos depois. De cabeça baixa, pressionando as têmporas, eu segui até minha casa onde sabia que meus pais não estariam.
         Entrei e fui direto para o meu quarto, onde me joguei na cama, deixando a mochila no chão, e fiquei olhando para o teto. Com a súbita parada, depois de ter vindo a passos largos desde a escola, meu peito arfava com força, tentando buscar ar. Minha cabeça ainda estava meio tonta com tudo o que estava acontecendo. Eu não sabia o que fazer. Parecia que sete anos de mágoa reprimida estavam querendo sair em um dia – e saíram, por um minuto. Era muita coisa e não seria fácil. Porque ele decidira voltar justo agora? Eu estava bem sem ele, tudo era tão mais simples quando eu era simplesmente a Ann, revoltada com a vida, que resolvera usar preto e maquiagem pesada enquanto fumava em algum pub esquisito com seus amigos esquisitos. Eu era mais feliz assim. Era fria, não precisava de ajuda, me virava sozinha, de uma forma que eu nunca havia conseguido antes. Por um momento me veio uma súbita vontade de colocar tudo para fora novamente, como havia acontecido na noite anterior, mas lembrei, então, de que não havia comido nada naquele dia. Tinha saído sem tomar café e meu estômago agora roncava como uma britadeira. Segurei a barriga e decidi que precisava de um lanche. Talvez me distraísse e com certeza melhoraria o mal estar, mas não estava pronta para sair da cama. Era algo que me reconfortava e eu queria ficar deitada ali pelo resto da minha vida. Eu sabia bem o que era aquela vontade. Fechei os olhos e fiquei sentindo a batida do meu coração por um longo tempo, que não faço ideia de quanto foi, até que me levantei de um salto com um ronco mais alto do meu estômago. Dei um sorriso e percebi que já não era hora de adiar. Fui até a cozinha correndo, abri a geladeira e tirei de um tudo que tinha dentro. Peguei o pão de forma no armário ao lado e joguei tudo em cima da bancada, começando um experimento de misturas absurdamente louco. No fim, meu sanduíche tinha o que me parecia quase dez metros de altura e recheado de coisas estranhas. Não me importava: pior do que ela estava não poderia ficar.
         Com meu monstro de vinte quilos no meu prato e um copo enorme de suco na outra mão, eu subi até meu quarto, para ligar a minha pequena televisão e ver se conseguia me distrair. Ao chegar, deixei o lanche no criado mudo e reparei na grande janela ao meu lado, que tinha vista justamente para uma casa que eu conhecia muito bem. A casa que, depois da minha, era onde eu passava mais tempo na minha infância. Sete anos atrás. A casa dos Hutcherson era no mesmo estilo da nossa por fora, mas por dentro sempre pareceu muito mais cara, até porque eles sempre tiveram mais dinheiro. Não foi a toa que eles se mudaram para Los Angeles, já que o pai dele era um produtor musical e tinha um pequeno estúdio por aqui, que foi comprado por uma empresa maior pela qual ele foi contratado... Porém, como qualquer coisa relativa ao show business, a maior procura só poderia estar na Califórnia, e lá se foram os Hutcherson, viver na ensolarada LA. E eu fiquei aqui. Sozinha. Sem meu melhor amigo. A janela que dava pra minha tinha as cortinas fechadas e eu fiquei pensando se aquele cômodo seria usado com a mesma finalidade que tinha há sete anos. Respirei fundo com a ideia e fui distraída pela movimentação na entrada ao longe, com a Michelle saindo pela porta principal com um monte de caixas e deixando na entrada da casa. Encolhi-me e corri pra sentar na cama. Era como se a presença dela fizesse tudo ainda mais real. Eles deviam estar desempacotando e arrumando as coisas enquanto Josh estava na escola. Mordi meu lábio e dei mais uma olhada pela janela, mas ela já não estava mais lá. Coloquei meus pés pra cima do colchão e abracei os joelhos, respirando cada vez mais fundo. Quando consegui me acalmar, peguei o controle e deixei em um canal qualquer, enquanto tirava a primeira mordida do meu monstro para a fome. Eu não prestaria atenção em nenhuma palavra da TV, mesmo.

Eu já tinha feito de tudo e aquela imagem da aula de Biologia não saía da minha cabeça. Os olhos baixos dele, o pesar na sua voz, mas eu não poderia deixá-lo falar. Ele viria com uma desculpa esfarrapada, foi ele que me abandonou, ele é o único culpado de tudo. De tudo o que minha vida é hoje.
Já eram 7 PM e eu ainda não havia saído do quarto, toda aquela tarde. Minha mãe já estava em casa há algum tempo e já tinha vindo cinquenta vezes ao meu quarto perguntar se eu estava bem ou se queria alguma coisa. Depois daquele sanduíche, não consegui comer mais nada. Também não quis jantar. Por incrível que pareça, ela não me perguntou de como tinha sido o primeiro dia de aula, ou se eu tinha encontrado Josh, e agradeci mentalmente por isso. Mas eu já não aguentava mais ficar dentro de casa, eu precisava fumar um cigarro, beber mais um pouco e tirá-lo da cabeça. E como era das outras vezes, tinha que ser sozinha. Eu não chamaria Lola, que não me entenderia, muito menos Stinky, que não me deixaria pensar momento algum. Coloquei uma calça jeans, uma blusa leve, um casaco com capuz e uma bota preta, e resolvi sair por aí, andar sem rumo e procurar algum lugar pra encher a cara. Desci as escadas com pressa, minha mãe estava na sala, rodeada por papeis do trabalho.
- Mamãe, eu vou sair. Vou dar uma volta, não me sinto bem, vou tentar respirar um pouco. – Ela se virou pra mim, como quem falaria algo, mas eu não deixei – Tento voltar cedo. – E bati a porta de casa, sentindo o vento fresco de início de outono bater no meu rosto. Coloquei as mãos pra dentro do bolso e abaixei o capuz. Segui andando como uma foragida pelas ruas, sem saber bem pra onde iria. De uma coisa eu estava certa: iria até a rua de bares e entraria em alguns dos últimos – onde eles nunca pediam identidade pra carinha certa. Pediria um drink qualquer e tomaria algumas doses.
Já estava por lá e a movimentação não era muita. Obviamente, por que era segunda-feira. Batia meus pés em algumas pedras da calçada, chutando-as pra longe e já andava num ritmo menos acelerado, quase correr estava me cansando. Quando virei a primeira esquina, em direção aos bares menos vigiados, enquanto olhava pro chão, bati em algo macio que quase me fez voltar com as nádegas na calçada. Um grito escaparia da minha garganta, se não tivessem me segurado com tanta firmeza, e me prendido contra algo que só poderia ser um corpo. Ao olhar fixamente para o rosto, porém, percebi ser o corpo que eu não queria ver.
- O que tá fazendo aqui? – Josh perguntou, enquanto eu me debatia arredia em seus braços. Ele me soltou devagar e eu ajeitei minha roupa.
- Eu que te pergunto: o que tá fazendo aqui? – Eu cruzei os braços, indignada. Será que nem mesmo na minha noite de paz eu não conseguiria me livrar desse garoto?
- Por favor, Ann...abeth. – Ele corrigiu rapidamente, diante da minha cara de reprovação. – Ia entrar nessa rua? Não é um lugar pra ser frequentado por garotas.
- Isso explica ainda menos o que você estava fazendo lá – Eu dei um sorriso sarcástico enquanto batia os sapatos na calçada. Ele riu tímido e abaixou a cabeça, coisa que ele sempre fez desde criança. Nunca mudara.
- Eu me perdi, só isso... Ainda que pareça o mesmo, Jersey tá bem diferente. Não acha? – Ele colocou as mãos no bolso enquanto dizia a frase e agora me encarava esperando resposta.
- O tempo passa e muita coisa muda, Hutcherson. – Falei, tentando continuar meu caminho, me desviando dele para seguir pela rua em frente, mas ele me segurou pela cintura.
- Opa, opa, opa... Você não vai pra lá! – Ele disse, simples, como se fosse algo tão natural pra ele quanto respirar.
- Quem você é agora, minha mãe? – Eu perguntei, sem acreditar que ele estava tentando mandar em mim.
- Já disse que não é lugar pra você. É perigoso. – Ele tinha um tom de preocupado em sua voz, mas eu o interrompi.
- Acha que não sei me defender? Acha que eu preciso mesmo de você pra isso? – Eu ri, olhando pra cima e logo em seguida voltando meu olhar para o dele. Acho que ele já havia entendido – porque não pensou nisso há sete anos? Se eu estou viva até agora é porque eu sei me virar muito bem sem você...
         Continuei a andar na brecha em que seus braços se afrouxaram do meu corpo, mas ele me segurou pela mão. Eu estava prestes a bufar.
         - Por favor, Ann. Só hoje. Você poderia ficar comigo, pra conversarmos? – Ele me encara com os olhos brilhando sob a luz do luar. Era tentador, na verdade. Me fez lembrar do quanto eu gostava dele e do quanto ele era necessário. Sua pele clara reluzia e ele estava sério. A linha fina dos lábios contraída. Tenso. Eu fiquei em silêncio, olhando nós dois, sentindo suas mãos nas minhas.
         - Um jantar. Por favor, eu só quero que jante comigo hoje. – Ele disse, e me fez rir. Finalmente, um sorriso sincero. Ele sorriu também, sem entender.
         - Você convida as meninas pra jantar? Los Angeles deve ter sido um céu pra você, mauricinho de mamãe. Vai pra Berkeley, provavelmente não é? Ou não, quer ficar perto de papai e mamãe. Columbia tem um ótimo curso de direito, sabia. – Eu coloquei minha mão livre na cintura, enquanto zombava dele. Ele mordeu o lábio, e relaxou o corpo.
         - Você entendeu, não se faça de espertinha, Ann. – Ele me puxou pra mais perto. – Por favor. Ou você acha que é a única que pode falar o que quiser? – Nossos olhos estavam bem próximos, pouco mais de um palmo nos separava e eu podia sentir sua respiração no clima frio a nossa volta. Dei um tempo para a minha respiração se acertar enquanto eu pensava em qual era a melhor resposta. Eu precisava daquele tempo sozinha, mas talvez ele tivesse algo a me contar. Parte de mim queria muito que ele me fizesse esquecer que foi um total idiota durante tanto tempo. E essa parte estava me ganhando.
         - Tudo bem – Concordei, me soltando dele e me afastando um pouco - Mas você paga. – Ele sorriu, e saímos daquele beco, seguindo em direção a uma lanchonete próxima.

         Estávamos os dois, sentados na Miracle Bites, a nossa lanchonete favorita de quando éramos crianças. Era golpe baixo ele ter me levado justo pra lá, ele com certeza queria tentar me amolecer, mas não conseguiria. Eu seria durona, como sempre soube fazer. Eu estava recostada na cadeira e o garçom veio com rapidez anotar nossos pedidos, eu estava prestes a dizer quando ele me interrompeu.
         - Pra mim um triplo, com muito bacon e capricha no queijo, mais uma lata de refrigerante e pra mocinha... – Eu levantei uma das sobrancelhas, sem acreditar que ele pediria por mim – Um duplo cheddar, sem maionese e refrigerante no copo especial.
         O garçom anotou, agradeceu e disse que ficaria pronto em minutos, deixando-nos a sós.
         - Não acredito que você ainda se lembra – Eu perguntei, realmente encantada. Depois desse tempo todo ele lembrava qual era meu hambuguer favorito e como eu gostava da minha bebida. Existiriam mais coisas que ele não teria esquecido?
         - É claro que lembro, eu nunca esqueceria – Ele respirou fundo, apoiando os cotovelos na mesa. – Você pode ter mudado o estilo, mas eu acho que não mudou quem você é por dentro.
         - Não se engane, eu ando muito diferente. – Eu tentei parecer convencida, mas não dava certo. Ele parecia trazer a tona coisas que eu levei anos pra enterrar.
         - Ann, eu preciso te explicar algumas coisas – Sua expressão ficou mais séria, e eu também parei de sorrir. Esperava o que ele iria dizer, apenas encarando. – Eu sei que você pode achar que eu te abandonei, mas não é verdade... Não mesmo. Eu queria te contar o que aconteceu.
         - Pois, eu sou toda ouvidos – Eu respirei fundo e cruzei os braços, tentando me concentrar e ouvir a desculpa esfarrapada que viria. Os olhos dele se abaixaram por um momento e depois voltaram a encontrar os meus quando ele começou a falar:
         - Depois que fomos embora e prometemos nos comunicar, bem... Você se lembra daquele primeiro ano, não? – Fiz que sim com a cabeça – Pois bem, ele foi até tranquilo. Eu te mandava cartas sempre e você fazia o mesmo, quando dava eu ligava e a gente conversava tanto. Lembra? – Eu sorri com a lembrança – Era bom. Mas com o passar do tempo, minha mãe começou a evitar. Cortava os horários para os telefonemas e ao mesmo tempo, parecia que suas cartas demoravam pra chegar. Lembra-se que depois das férias de dezembro, ficamos mais afastados, não? – Eu respirei fundo, nem concordando, nem discordando. Estava desconfortável. – Bem, nas férias de verão eu sabia que pediria para os meus pais para ir te ver, só que antes mesmo de eu lembrá-los disso, eles me deram uma passagem. Iríamos para o Havaí e eu fiquei deslumbrado, eu era uma criança.
         - E por isso, você não veio? – Eu respirava com dificuldade.
         - Isso... Mas logo que voltei eu tinha tantas coisas pra te contar. Te mandei uma carta enorme, e te mandei presentes. Mas... – Ele respirou fundo antes de continuar – Você não respondeu.
         - Presentes? Do que você tá falando? – Ele pareceu não ter me ouvido e continuou a sua história.
         - E eu já estava desapontado, mas as coisas começaram a melhorar na escola. Eu tava no sétimo ano e entrei pro time de basquete júnior. Comecei a viajar nas férias para jogos intermunicipais e logo interestaduais e foi uma fase ótima... – Ele segurava os dedos, nervoso – Eu fiquei sem tempo e... Nas escassas vezes eu tentava me corresponder eu não tinha resposta. Decidi parar... – Ele me encarou, sorrindo fraco – Agora entendi por que... Eu não sei o que disse, não sei o que fiz, se foi a viagem, me desculpa... Eu... Eu sentia sua falta, todos os dias.
         Eu não conseguia responder, eu tinha me ausentado da conversa há algum tempo porque algumas coisas começaram a se ligar na minha cabeça, mas eu não tinha certeza. Ele podia estar inventando aquilo tudo, só pra me fazer cair nas armadilhas dele. Eu mudei, ele pode muito bem ter mudado. Ele era popular em Los Angeles, existem truques que essas pessoas fazem só pra rirem das caras de pessoas como eu. Eu segurava na mesa como se fosse cair.
         - Eu... – Foi o que consegui dizer, e ele se recostou na cadeira, parecendo prestar atenção – Depois que você foi embora... Eu entrei em depressão. Você soube?
         - Não! – Ele exclamou, se inclinando até a mim, com a mão estendida por cima da mesa, como que para que eu pegasse. Não o fiz.
         - Eu não contava nas cartas, porque era meu momento de felicidade. Mas toda vez que eu terminava uma carta, ou uma ligação, eu ficava pior. Sabendo que você nunca voltaria. – Meus olhos se encheram d’água involuntariamente – Minha mãe então me levou a um psicólogo – Respirei fundo – E ele ia trabalhando comigo, e eu fui me sentindo melhor, mas aos poucos as suas cartas foram ficando mais distantes. Elas não chegavam, ou demoravam a chegar, e parecia que a gente estava se afastando. – Engoli em seco e uma lágrima fujona escapou dos meus olhos. – Depois das férias, quando você não veio, eu me fechei para o mundo. Menti nas sessões do psicólogo dizendo que tudo estava bem e minha mãe me tirou de lá, achando que o tratamento tivesse dado certo, mas não! – Eu subi um pouco o tom de voz nessa hora. Ele não tirava os olhos de mim – Eu só guardei tudo, comigo. Parei de mostrar... Eu não tinha mais amigos, Josh. Eu era a garota estranha. – Sequei a lágrima que rolava pela minha bochecha e continuei – Foram dois anos assim, e foi quando eu conheci a Lola. Ela meio que me consolou. – Engoli o choro e me ajeitei na cadeira – Eu me refiz com ela, eu virei isso aqui. – Bati no meu próprio peito e percebi seu olhar pesando sobre mim. Era como se ele tivesse... Pena? – Magoada por dentro, escondendo tudo... Nem eu mesma sei quem eu sou agora, porque eu escondo coisas de mim mesa, pra não sofrer, você não entende? – Nos olhávamos. Eu arfava, ele não se movia. – Eu não sei o que aconteceu, eu não sei se é verdade... Mas já passou. Você me deixou, ok?
         - Mas eu não queria – Dessa vez ele pegou a minha mão e eu encarei a cena, no susto, mas não soltei. Ele continuou a falar – Eu não queria ir, eu também não sei o que houve, não sei que ruídos foram esses, mas a verdade é que eu precisava de você! E ainda preciso. – Ele passou a outra mão por cima da mesa, segurando a minha mão livre – Eu sei que aconteceu, mas é passado. A gente pode fazer o presente. Eu só peço pra que você me deixe compensar todo esse tempo. Não deixa o futuro ser tão ruim quanto foi o antes... Eu estou aqui agora. Não quer fazer valer a pena?
         Nossos olhos estavam juntos, e eu não percebia mais ninguém naquele lugar. Eram muitas informações, muitas novidades e muitas coisas sem explicação. Mas a questão maior era que eu queria. Queria ficar com ele, queria sorrir com ele, e queria dar uma nova chance pra nós dois, mas seria complicado. Eu ainda precisava juntar muitas peças desse quebra-cabeça, algumas coisas não batiam. Ele podia estar mentindo, mas não adiantava nada pensar nisso agora. Não com o garçom que acabara de chegar deixando dois pratos e bebidas na nossa mesa.
         - Bom apetite – Ele disse. E se retirou deixando-nos com nosso desconfortável silêncio.

         O silêncio não durou muito. Ele quebrou, contando de como era a vida em Los Angeles e eu acabei contando um pouco do que acontecera em New Jersey nos últimos anos. Ele parecia ter tudo por lá e não sei como ficava tão tranquilo de ter deixado e voltado pra cá. Comemos devagar e já eram 10 PM quando saímos da lanchonete. As coisas pareciam promissoras, ele relembrou de um dos meus apelidos antigos (BanAnna, porque eu era bem devagar em entender certas coisas) e ficou me irritando com velhos problemas. Pela primeira vez em tanto tempo eu ria de uma forma que dava gosto e que realmente me fazia feliz. Quando comecei a perceber essa sensação, andando de volta pra casa, resolvi que era hora de freá-la. Tirei do bolso um maço de cigarros, peguei um e com o isqueiro, o ascendi. Ele acompanhou tudo, sem dizer uma palavra. Dei um trago e joguei a fumaça pro ar.
         - É tão engraçado! – Ele ria, e eu o encarei.
         - O quê? – Eu disse, levando o cigarro a boca.
         - Ver você fumar... Gosta mesmo disso? – Ele ainda ria, eu olhei pro outro lado.
         - É bem elegante, na verdade... – Eu não o encarei, mas pude ouvir sua risada.
         - Se você diz... – E fizemos o final do caminho todo, que já não era muito, em silêncio. Eu fumando, ele chutando pedras. Quando chegamos em frente a minha casa, joguei o cigarro no canteiro e o encarei.
         - Não pense que isso vai mudar alguma coisa, ok? – Eu falei e ele me olhou como quem não entendia – Só porque nos divertimos, não significa que eu sou sua amiga novamente.
         Entrei pelo caminho sem esperança de que ele me respondesse. Ele não podia achar que chegaria aqui e em um dia consertaria tudo, era ser fácil demais. Coloquei as mãos dentro da jaqueta e continuei andando até a entrada de casa, sem olhar pra trás e sem esperança de qualquer resposta dele, porém antes que eu pisasse nos degraus da varanda, o ouvi gritar ao longe:
         - Se você diz... 

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